"...além de apreender que não se podem colocar baldes com água na bagageira,
valorizei o ensinamento que não vale a pena perder tempo com coisas sem
importância."
João
Mil novecentos e oitenta e três. Início de Agosto. Destino: Fuzeta!
O tio pega na tia, na prima e em mim. Partimos para as tradicionais férias de Verão. A «catrela» transporta-nos rumo ao Sul.A rotina impera. Convinha não esquecer os objetos essenciais para uma estadia tranquila na praia: o ancinho, a pá, as formas e, claro, o balde. Tudo bem acomodado. O tio ao volante, a tia no «lugar do morto», eu e a prima atrás. Atrás, as malas, os utensílios de brincadeira e o farnel.
Toda a fase preparativa da viagem e a tarde vai longa. E o Algarve não é ali já. Só de caminho são seis horas, talvez sete, se a ponte de Alcácer do Sal permitir. Caso contrário, arriscamo-nos a demorar mesmo oito ou nove horas.Tudo vai correndo num ambiente animado desde a partida. O tio, irónico como sempre foi, diz umas piadas. A tia ria-se das graçolas e afirma: “O papá tem piada”. A prima insurge-se e grita, num tom ameaçador: “O papá é meu!”. Eu, apesar da tenra idade, registo, anoto, um dia pode ser que seja útil.
A canícula alentejana observa-se. A amargura de uma paisagem tórrida e seca, no meio de uma vasta planície, influencia o tio a parar. É hora de comer as sandes de ovo mexido, beber um Compal e ganhar forças para o resta da viagem.
O tio abre a bagageira e depara-se com um pequeno problema: havia uma ligeira inundação. Terá pensado: “Mas que raio, o que se passará?”O balde, o balde que eu carinhosamente colocara no porta-bagagens entornara água. Previra tudo, não me fosse faltar o mar e agora acontece-me esta. Quem não está a gostar muito da situação é o tio, que ruborizado diz-me: “Então tu trazes-me o balde cheio de água?” Eu fico encolhido e sem dizer nada só me ocorre um pensamento: “Será que o tio volta para trás, deixa-me em casa e já não vou para o Algarve.” Há tanto tempo que andava a planear idas à praia com a prima e agora estou lixado.O tio surpreende, passa-lhe a ira, opta pela brincadeira e goza comigo o resto das férias. Ainda conta ao meu pai, fazendo uso de toda a sua ironia.
O tio não se recorda desta história, porém eu não esqueci, até porque para além de apreender que não se podem colocar baldes com água na bagageira, valorizei o ensinamento que não vale a pena perder tempo com coisas sem importância. É a moral do episódio: ironizar, ironizar e ironizar. Por isso, o meu pai, que não vai muito à bola com as brincadeiras do tio, quando se chateia com os meus gozos, diz, enfurecido: “Lá estás tu com essas piadas à Armando!” A genética tem destas coisas. Ele afirma: “Lá estás tu…” Eu tenho piadas “à Armando”.
Parabéns «Pencas», muitas felicidades e um grande abraço do sobrinho João Queiroz.
Não me devo ter chateado muito com o balde da água, porque já me tinha acontecido pior.
ResponderEliminarPosso-te garantir que foi uma situação em que o carro ficou a cheirar a vinho durante uns tempos.
Mas não vou entrar em pormenores para não criar mais uma piada à Armando.
Claro que o teu avô Zé Queirós, também nunca teve conhecimento dessa minha “habilidade” para não ter que ouvir: “tudo assim fazeis”
Se recordas a viagem para a Fuzeta, deves lembrar melhor a estadia dos dois primos com o Senhor Tavares e D. Cristina que, por certo, foram tempos bem mais divertidos
Que maravilha de história!
ResponderEliminarGanda João! Já sei a quem sai o tio!
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